quarta-feira, 6 de setembro de 2017

O ricochete do cangaceiro


Há vários meses Belarmino tem sofrido com uma intercorrência de pneumonia aspirativa. Quando voltou a morar em João Pessoa, em janeiro de 2017, tinha surtos de febre. Desde o ano passado a alimentação era pastosa ou líquida, por ter dificuldade em mastigar e engolir, consequência das fortes sessões de radioterapia, na época em que combateu o câncer. Por volta de abril, tratou uma pneumonia em casa e foi curada. Mas em junho e julho, sofreu outra infecção nos pulmões e teve que ser internado. Foi para o Hospital Memorial São Francisco, montou um escritório, onde trabalhou por onze dias. Aluguel caro: quarenta mil reais. Sem plano de saúde, resolveu acionando suas economias.
Ao se despedir daqueles a quem cativou em pouco tempo, o médico Italo Kumamoto, fundador do hospital, veio cumprimentar-lhe. Belarmino falou-lhe, sinceramente:

- Doutor Kumamoto, eu sou empresário há mais de 40 anos e uma empresa tem que ter alma. Alma é a equipe; e sua equipe é nota 10. Mantenha a alma de seu hospital.

O depoimento foi postado no Facebook e, rapidamente, mais de 80 pessoas deixaram mensagens. Desde 1976, quando montou sua primeira empresa, Belarmino teve cerca de 4.500. Jamais sofreu uma questão trabalhista.

Elogio e cacetada, por merecimento.

Em 1983 Belarmino montou a primeira revenda de microcomputadores do Norte e Nordeste, a Elógica Micro Sistemas Ltda. O nome foi sugestão do sócio Antonio Dieudoné Pascoal Camargo, parceiro desde 1981. Outro que andava lado à lado, no bando, era Mivacyr Meira Lima, pessoa fundamental na trajetória empresarial de Belarmino, por mais de 35 anos.
Arquivo pessoal de J.E.B.A.
Eles alugaram uma casa vizinha de outra empresa de Belarmino, na Rua da Hora, 88, no Bairro do Espinheiro, em Recife. Reformaram em tempo recorde, inauguraram com pompa e circunstância e montaram uma escola só para cursos de informática, onde podia se encontrar turmas para crianças.
Um dos produtos da loja eram os microcomputadores da Brascom Computadores Brasileiros. Fundada em 1980 e adquiriu autorização da Secretaria Especial de Informática (SEI) para começar a fabricar micros em 1982.
Certa vez, a Elógica comprou um grande lote de micros BR-1000, que já estavam praticamente revendidos. Pagou, mas “quase” não recebeu a encomenda. Uma história que Mivacyr se divertiu ao lembrar:

- Depois de nos ter vendido uma boa quantidade de computadores, através do sr. Manfredini, o gerente para nossa região, o dono da Brascom, Sr. Jorge, anunciou que ia fechar a empresa por dificuldades financeiras, (gastou o dinheiro de forma não muito legítima, pelo menos se comentava nos corredores da Brascom). Ora, a empresa sendo dele mesmo, claro, ele podia fazer o que achasse melhor; mas tinha que dar alguma condição aos clientes compradores daqueles equipamentos, ou seja, nos fornecer peças de reposição ou pelo menos os endereços dos seus fornecedores nos Estados Unidos. O Sr. Jorge negou.
Belarmino mandou comprar duas passagens, corujão, e fomos a São Paulo. A coisa engrossou e no gabinete do "importante" Sr. Jorge. Belarmino partiu pra cima, ao ponto de querer jogar um enorme aquário. Imagine eu, baixinho, no meio dos dois sem nada conseguir com este meu físico!

Belarmino não perde a chance de completar:

- O governo havia feito uma grande desvalorização do dólar. A inflação era galopante. Chegamos pela manhã na luxuosa sede da Brascom, no Morumbi, ao lado da Kodak. O dono chegou ao meio dia. Nos atendeu junto com a diretoria às 14 horas. Levantei na suntuosa sala e fui dizendo: “Você vai me entregar as máquinas, ou vou lhe encher de porrada.” Fui na sua direção e ele começou a me falar de educação. Eu estava decidido. Alguns diretores tentaram se levantar, eu dei um berro e botei a mão no bolso imitando uma arma. Continuei, dei mais alguns passos e ele disse: “Entrego na saída”. Táxi. Aeroporto. Recife. Todos meus clientes foram atendidos.


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Fontes: Depoimentos de dona Celeide, esposa de Belarmino; Mivacyr; e Belarmino. “Carcinha – a biografia a ser publicada”. “A reserva de mercado na área de informática da década de 70 / 80”. Reinaldo Bogomolow. Dissertação. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo. 2006.

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